EU NÃO SOU HIPÓCRITA?!
Desde criança, nunca colei nas provas da escola ou da faculdade. Nunca fingi virtudes que não tenho e também nunca conheci um hipócrita convicto, sempre há considerações. Nunca dei ou pedi conselhos a ninguém em toda a minha vida, porque aquele que pede, e está de fato sendo verdadeiro, tem a intenção de demonstrar grande respeito pela opinião do amigo, mas, no fundo, seu desejo é aprovar seu próprio ponto de vista e, assim, tornar o outro, em parte, corresponsável. O conselheiro, imbuído de suas verdades, devolve a confiança, desinteressadamente, apesar de, quase sempre, querer satisfazer a si mesmo ou à sua glória com a aprovação do outro.
Nunca propus modelo de vida a ninguém, porque já acho dúbio o meu próprio modelo, um tanto quanto niilista. Nunca disse: “faça o que digo, mas não faça o que faço”, não sei quem vomitou esta frase, mas ela representa perfeitamente a hipocrisia.
Minha moral e igual à de todos, acima de qualquer suspeita, inabalável, inquestionável, inflexível, incorruptível. Sempre falo as minhas verdades. Não faço falsos elogios a amigos ou amigas do tipo: “Nossa como você está linda hoje!” ou “nossa, como você emagreceu!” ou ainda “você está cada vez mais jovem”. Não minto, nem mesmo para a minha esposa, não desejo outras mulheres e nunca fiz sexo fora do casamento. Não dissimulo, não represento, não finjo ser o que não sou até estourar o cartão de crédito e o cheque especial. Não furo filas, não compro CDs e DVDs piratas ou qualquer grife falsificada. Não sonego impostos e nunca enganei o meu patrão, não dou desculpas evasivas para justificar meus erros e ludibriar o outro. Nunca olhei para a bunda de uma mulher a não ser da minha santíssima esposa.
Sou politicamente correto. Levanto do assento para dar lugar aos mais velhos e enfermos. Quando acho dinheiro ou pertences, procuro o dono e devolvo imediatamente sem pedir recompensas. Quando vejo algo errado não passo reto, vou lá e tomo as devidas providências e faço meu papel de cidadão. Não fecho os olhos para a miséria do mundo e da minha rua, ajudo os miseráveis, visito a casa dos pobres, periodicamente, e também a dos anciães. Doo pelo menos uma hora por semana do meu tempo para ajudar alguém.
Nunca infringir as leis de trânsito. Não estaciono nas calçadas, atrapalhando os pedestres, não passo o semáforo antes que o sinal abra para mim. Nunca ingeri bebida alcoólica ao dirigir e sempre uso o cinto de segurança. Respeito os direitos dos pedestres.
Não sou hipócrita. Eu realmente acredito na democracia brasileira, aqui não existe favoritismos ou qualquer tipo de corporativismo, todos nós temos direitos iguais. Quem nasce no lixão tem as mesmas oportunidades de chegar a uma faculdade que um filho de um senador ou deputado, não há nenhuma desigualdade em nosso país.
Nunca pedi favores a políticos em época de eleição, seja um emprego ou um cargo comissionado para amigos, parentes ou para mim mesmo. Não peço consulta médica, nem óculos, nem remédios, nem carteira de habilitação e nem tijolos ou telhas ou qualquer outro material de construção. Eu não preciso desse tipo de favoritismo político.
Nunca pronunciei a palavra de Deus em vão, para enaltecer meu espírito diante da presença de outros. Sempre faço minhas orações em silêncio para não chamar a atenção. Nunca falei mal de outras religiões. Nunca disse que a minha religião era a melhor, a mais perfeita e verdadeira de todas sem ter conhecimento mínimo da doutrina das outras. Eu nunca disse: minha fé é inabalável sem antes fazer uma reflexão profunda do meu passado e presente. Nunca fiquei sorrindo e demonstrando felicidade para que as outras pessoas vejam em mim a gloria de Deus. Nunca usei a igreja como palco político, nem como forma de autopromoção, nem para mostrar minha melhor roupa ou a bíblia cara que comprei. Nunca revelei, em murmúrios, quanto dei de dízimo ou oferta. Nunca desejei mal a ninguém, nunca blasfemei ou me enraiveci, sempre fui controlado e comedido, só falo o necessário. Nunca pedi perdão sabendo que vou pecar de novo daqui a alguns minutos. Nunca usei a velha frase, “pecar é humano” como desculpas para prosseguir nos meus erros e pecados.
Mas não fique triste, caso você se enquadre em alguns desses estereótipos, isso não faz de você um hipócrita maior ou menor, mas apenas um hipócrita como outro qualquer quando diz que não se enquadra. Assumir, isso sim, talvez seja uma virtude.
Não tentem me imitar, ou seguir meus passos, pode ser perigoso.
Assim vou eu caminhando pela humanidade, invisível aos olhos limitados pelas cores do mundo, mundo ao alcance das mãos, mas longe da alma dos olhos.
Leandro Dumont
20/07/2012